terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Panelinha Poética V - Jalna Gordiano


Eu não preciso de ti 
              (ou nunca precisei de ninguém)*

 Morrer nunca foi fácil
Tão fácil assim
A covardia tomou conta

Sei que o dia virá
Se não vier,
Existem certas coisas que também não posso mudar

Quando Cristo voltar
Vou olhar como meus chapados olhos de tédio e tristeza e dizer:
Demorô...

A porta ficou aberta,
Te acompanhei até o ônibus
Chega de frescura

Nunca precisei de ninguém
De ti também.
Certos dias sempre demoraram a passar.

A noite volta
O sol reaparece
As rugas nascem
O mundo morre ao redor

Matei todos que me cercavam
Afastei toda espécie de sentimento alheio
Fico aqui
Ruminando meus restos
Neste sepulcro de areia, cimento e madeira.

Nunca precisei de sol nem de mim
De ti ou da TV
Quero o controle remoto somente para
Desligar e dormir.

Tropeço em ruas planas
Bêbada
Brinco de levitar
Converso com muitas pessoas estranhas
Mais até que eu mesma
Desinteressantes ao mundo
Recheadas a mim
Discuto com o cobrador do ônibus
Por causas alheias

Insulto
Deus o dia todo
Chamo traíra
Cuspo pra cima
E de noite rezo pedindo perdão

Corro pelo corredor como meu filho
Dou banho e faço mamadeiras
Ponho a dormir cantando nós dois

Ainda consigo me comover
Mais e mais
Ainda consigo chorar ao assistir comerciais
Soluçante
Ainda amo todos meus ex-amores
Fielmente

Não vá embora por minha loucura
Pelo meu excesso de vidas
Não vá embora por ser perturbado por mim
Por palavras mau ditas

Ainda posso rir de nós todos
Ainda sei cozinhar pra você
Ainda posso te apresentar puteiros imundos e te escolher garotas

Posso deitar no teu colo e ganhar afagos?
Posso
Irritar-te insanamente para fazer-mos amor
toda a madrugada?
Posso te ligar às três da manhã pra te contar dos bêbados que não dormiam
na cidade?



O fim está próximo*

Quantas vezes pensei
em me afundar na terra
E nunca mais voltar por tanta vergonha,

Mas tenho a alma de um pugilista em fim de carreira.
Ele me obriga a cerrar os punhos, fazer cara feia
E gritar o primitivo;
Voltar à luta.

Minha vida decresce em tons ascendentes
Descrentes...

Sou feito à lua e mudo rapidamente em fases;
Sou o deus sol
Aprendi a lentamente mostrar minha divisão em estações.

Quando meu rosto está no chão,
Eles vêm e pisam minha cara;
Escondo o riso.

Quem me julga,
Tem os discursos mais incisivos...

São mais drogados,
Traíras,
Sujos da pior bosta
Que só a infelicidade, vazio
E falta de comoção produzem.

Quem me julga,
Usa as máscaras mais ridículas
E inverossímeis nas almas,
Tristes palhaços de sim mesmos.

Sou eterna e tenho medo do fim.
Sinto muitas dores e medos evidentes,
Bares e igrejas sempre existirão.

O que me permite tanta liberdade
É minha inconstância.
Preciso somente ser
Um pouco mais de paciência:
O fim está próximo.


* do livro ASMA dentre outros prazeres, a dor 
de Jalna Gordiano

Um comentário:

  1. BELÍSSIMO POEMA. JÁ O CONHECIA.
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