terça-feira, 31 de maio de 2011

PANELINHA POÉTICA II

 DORI CARVALHO 

 

 

O menino e os poetas

a Thiago de Mello

quando menino ganhei não presentes caros
mas cheios de sabedoria, delicados e raros

quatro livros de poesia, pura poesia
meu Deus, que descoberta, que alegria
Carlos Drummond de Andrade
ensinou-me a sentir a alma das cidades
Manuel Bandeira, mil bandeiras,
desde aí, caminhei sem eira nem beira
Pablo, isla negra, Neruda
mostrou-me a ternura e a vida desnuda
Thiago, amazônico Thiago de Mello
cantou-me que o mundo ainda pode ser belo.

um livro de muitas batalhas
El Che, Ernesto Guevara
sangrou-me o quanto a vida é cara.

e uma pataca de prata de quatrocentos réis
presente de aniversário do meu padrinho.

por isso, ando com esse sentimento do mundo
que tanto me faz sofrer e faz sonhar
por isso, o silêncio e a palavra
por isso, essa dureza e essa ternura
por isso, a sede de liberdade e as canções desesperadas
por isso, levo em meu coração um pouco de poesia
por isso, trago em minha boca um copo de pasárgada
que tanto me faz amar e viver
por isso, carrego na lembrança
o fuzil, que, in-felizmente, nunca usei
e a pataca de prata que perdi
e nunca soube multiplicar.



As tetas do povo



Fiquem aí os senhores
Mamando nas tetas
                        do povo
Enquanto o povo
Mama nas tetas
                    das pedras

cuidado senhores muito cuidado
qualquer dia
as pedras viram armas
qualquer dia
        a fome vira raiva
qualquer dia
               a casa cai



Descaminhos


Caí derrotado na glória
Manda brasa queimando ilusões 
Tudo não passou de arremedo 
No beco do macedo 
Afogado na ponta negra 
Andei com desleixo 
Pela estrada do aleixo 
Na vila da prata 
A saudade quase mata 
Frei José dos inocentes 
Nem tão inocente assim 
Itamaracara e coragem 
No tiradentes enforcado 
Gritei feito um demente 
E ninguém ouviu 
Murcharam os lírios do vale 
Eldorado nem aqui 
Nem no solimões 
No raimundo 
Nem rima nem solução 
No são jorge 
Fui guerreiro e dragão 
Alvorada um dois três 
Eu canto outra vez 
E o sol não vem 
No morro da liberdade
 

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